Coldplay retorna a São Paulo com seu inesquecível show de cores

Com direito a gravação de filme, o grupo apresentou no Allianz Parque nesta terça-feira (7) sua melhor performance em território brasileiro

Gabriel Haguiô
6 min readNov 9, 2017

É difícil adivinhar por quais feitos o Coldplay será lembrado daqui a alguns anos. A banda explodiu entre os veteranos da cena britânica no início do século e desde então tem conquistado cada vez mais espaço e autonomia na atual indústria fonográfica — ainda que tenha perdido algumas de suas vertentes originais no caminho, em meio à busca por abordagens mais acessíveis ao mainstream que tem desapontando muitos de seus fãs (incluindo este redator aqui).

É inegável, entretanto, a forma como Chris Martin, Jonny Buckland, Guy Berryman e Will Champion têm se renovado quanto às performances ao vivo, direcionadas para audiências cada vez maiores. O grupo que iluminou e euforizou um público de mais de 45 mil pessoas no Allianz Parque, em São Paulo, na noite desta terça-feira (7) certamente não é mais o mesmo que costumava frequentar competições de bandas universitárias e esbanjar as diversas influências musicais da época.

Exatamente 19 meses após sua última passagem pela capital paulista, o quarteto retorna para a etapa final da “A Head Full Of Dreams Tour”, que ainda se estenderá para Porto Alegre e Buenos Aires. Apesar do show ter se mantido essencialmente o mesmo nesse meio-tempo, as circunstâncias já são bem diferentes: de lá pra cá, foram US$ 499 milhões arrecadados em 5 milhões de ingressos vendidos pelo mundo, números suficientes para consolidar a turnê como a terceira maior de todos os tempos.

Contudo, o discurso de Charlie Chaplin em “O Grande Ditador”, de 1940, reproduzido logo ao início da apresentação, não poderia ser mais atual. O clamor pela reivindicação de poder do povo não conseguiria descrever melhor o clima otimista de união proposto pelo grupo nas mais de duas horas seguintes e rapidamente alastrado com as primeiras batidas de “A Head Full Of Dreams”.

A banda deu início aos trabalhos após uma hora de atraso (previamente comunicado pelas suas redes sociais devido à problemas de logística) com o acender das milhares de xylobands, as clássicas pulseiras LED utilizadas nos shows desde 2012, pintando o estádio em vermelho e conferindo uma atmosfera ainda mais grandiosa e envolvente à performance. Já não bastasse todo o brilho, uma chuva de papel picado ainda explodiu pela passarela ao ápice da canção — momento este que se repetiria nos hits mais recentes “Hymn For The Weekend” e “Something Just Like This”.

Todos estes são recursos que a banda usou e abusou ao longo da apresentação como parte de seu espetáculo visual e pirotécnico. Foram várias as vezes que o confete inundou o público e as pulseiras coloriram todo o Allianz Parque para a distração da plateia ao belíssimo mar de luzes nas arquibancadas, aproximando até mesmo àqueles que assistiam o grupo tocava músicas como “Paradise”, “A Sky Full Of Stars” e “Charlie Brown” — na qual Chris Martin pediu a todos os presentes para que deixassem os celulares de lado.

Entre tantos sucessos mais atuais, alguns dos clássicos mais antigos da banda estiveram presentes e marcaram alguns dos momentos mais memoráveis da noite. “Yellow” e “The Scientist”, apresentadas logo na primeira parte do show, foram entoadas aos pulmões pelo público e enfeitadas por centenas de balões amarelos e um oceano de luzes de celular, assim como em “Fix You”, que invocou toda a carga emocional de uma das composições mais sentimentais de Martin.

Aliás, que fiquem aqui registrados os méritos do cantor como um excelente mestre de cerimônias. O frontman conduziu toda a apresentação com fôlego e energia inesgotáveis — vide os vários rodopios e corridas pela passarela do palco principal — ao mesmo tempo que mantinha intacta a conexão entre a banda e a plateia, por diversas vezes convocada sob a alcunha de “melhor audiência do mundo”.

Em suma, foram pouquíssimas as mudanças no repertório em relação à última visita da banda, realçando-se a inclusão da inédita “Life Is Beautiful” e “God Put A Smile Upon Your Face” — que ganhou uma versão mais enérgica ao vivo —e a exclusão de um sofrível cover de David Bowie, substituído por um espaço de tempo maior para as performances acústicas do grupo. Apesar disso, o show conseguiu se tornar ainda mais especial do que o de abril de 2016, uma vez que o Allianz Parque foi anunciado como palco de gravações para um futuro filme da turnê.

Com isso, a apresentação ganhou um impulso ainda maior por parte dos membros do próprio quarteto, claramente empenhados para se certificarem de sua melhor performance. A ocasião rendeu alguns momentos únicos, como o baterista Will Champion assumindo os vocais pela primeira vez na sua vida em “In My Place”, e uma superprodução para o estádio, com telões, efeitos sonoros e cenários renovados pra a sorte dos que puderam comparecer por uma segunda vez em São Paulo.

Os momentos intimistas da apresentação ainda conquistaram seu próprio destaque em meio ao excesso de cores e truques performáticos. Os quatro integrantes se reuniram duas vezes em palcos secundários (um ao final da passarela e outro em meio à pista) para músicas mais introspectivas, como “Magic”, “Everglow” e “Til Kingdom Come”, mas não menos intensas — apesar do público parecer não ter correspondido com o mesmo fervor.

Já era quarta-feira quando o grupo deu início à última parte do show, voltada para alguns dos hinos de seu pop de arena com o objetivo de resgatar a energia do público — com êxito. Essa mesma vibração se fez presente em “Up&Up”, uma das melhores faixas lançadas pelos ingleses nessa década, que encerrou a noite em um clima de esperança e um sonoro “acredite no amor”.

A estrada esburacada pela qual o Coldplay percorreu ao longo de seus mais de vinte anos de carreira pode ter deixado alguns de seus fãs pelo caminho. Porém, com todo o brilho, entusiasmo e surpresa proporcionados pela sua melhor apresentação em solo brasileiro, é evidente que a banda nunca esteve maior.

Confira a setlist completa da apresentação:

PALCO PRINCIPAL:
1. “A Head Full Of Dreams”
2. “Yellow”
3. “Every Teardrop Is A Waterfall”
4. “The Scientist”
5. “God Put A Smile Upon Your Face”
6. “Paradise”

PALCO B:
7. “Always In My Head”
8. “Magic”
9. “Everglow”

PALCO PRINCIPAL:
10. “Clocks”
11. “Midnight”
12. “Charlie Brown”
13. “Hymn For The Weekend”
14. “Fix You”
15. “Viva La Vida”
16. “Adventure Of A Lifetime”

PALCO C:
17. “Us Against The World”
18. “In My Place”
19. “Til Kingdom Come”

PALCO PRINCIPAL:
20. “Life Is Beautiful”
21. “Something Just Like This”
22. “A Sky Full Of Stars”
23. “Up&Up”

Artigo originalmente publicado no Portal Tracklist por Gabriel Haguiô

--

--

Gabriel Haguiô

se escrevo o que sinto é porque assim diminuo a febre de sentir